MP 1.300/2025: o que muda no mercado livre de energia até 2027
Introdução: Uma Reforma Histórica em Andamento
O setor elétrico brasileiro está no centro de uma transformação regulatória sem precedentes. A Medida Provisória nº 1.300/2025 oficializa o plano progressivo de abertura total do mercado de energia até 2027, representando uma mudança estrutural que afetará mais de 93 milhões de unidades consumidoras no país.
Assinada pelo presidente Lula em 21 de maio de 2025, a MP 1300/2025 prevê a abertura total do mercado livre de energia a partir de dezembro de 2027 e institui uma nova tarifa social. Este artigo analisa tecnicamente os impactos regulatórios, o cronograma de implementação e as implicações práticas dessa medida para diferentes perfis de consumidores.
Contexto Regulatório: O Mercado Livre em Expansão
Antes de mergulharmos nas mudanças da MP 1.300/2025, é fundamental compreender o cenário atual. Segundo dados do último boletim da Abraceel, o mercado livre já conquistou 71.961 unidades consumidoras até março de 2025, um crescimento de 66% em 12 meses.
Diferenças Fundamentais: ACR vs ACL
O sistema elétrico brasileiro opera em dois ambientes distintos:
Ambiente de Contratação Regulada (ACR) - Mercado Cativo:
- Consumidor compra energia exclusivamente da distribuidora local
- Tarifas reguladas pela ANEEL
- Sem possibilidade de negociação de preço ou fonte
- Sujeito a bandeiras tarifárias
Ambiente de Contratação Livre (ACL) - Mercado Livre:
- Liberdade para escolher fornecedor de energia
- Negociação direta de preços, prazos e volumes
- Acesso a fontes renováveis específicas
- Previsibilidade de custos através de contratos
Com 25.966 novas unidades consumidoras em 2024, o mercado livre atingiu a marca de 64.497 unidades consumidores, crescimento de 67%, recorde histórico. Esse crescimento explosivo demonstra o apetite do mercado pela liberdade de escolha.
Cronograma de Abertura: Linha do Tempo até 2027
A MP 1.300/2025 estabelece um cronograma progressivo e bem definido para a universalização do mercado livre:
Fase 1: Agosto de 2026 - Indústria e Comércio
A partir de agosto de 2026, empresas conectadas em baixa tensão poderão migrar para o mercado livre. Em dezembro de 2027, todos os consumidores, inclusive residenciais, também terão esse direito.
Esta primeira fase abrange:
- Consumidores industriais de baixa tensão
- Estabelecimentos comerciais (Grupo B)
- Pequenas e médias empresas
- Contas a partir de aproximadamente R$ 5 mil mensais
Fase 2: Dezembro de 2027 - Universalização Completa
A abertura do mercado será gradual, começando em agosto de 2026 para setores da indústria e comércio ainda não contemplados, e em dezembro de 2027 para consumidores residenciais.
A fase final inclui:
- Todos os consumidores residenciais
- Pequenos comércios de baixa tensão
- Consumidores rurais
- Aproximadamente 93 milhões de unidades consumidoras
Status Atual: Janeiro de 2024
Desde 2024, apenas quem pertence ao Grupo A pode entrar no Mercado Livre de Energia. Desde janeiro de 2024, o mercado já foi parcialmente aberto para consumidores de alta e média tensão (Grupo A). Esta é a base sobre a qual a MP 1.300/2025 construirá a expansão.
Pilares Estruturais da MP 1.300/2025
A medida provisória se organiza em três eixos principais:
1. Nova Tarifa Social de Energia
A Nova Tarifa Social prevê gratuidade no fornecimento de energia elétrica para famílias inscritas no CadÚnico com renda mensal de até meio salário mínimo por pessoa (até R$ 759) e que consomem até 80 quilowatts-hora (kWh) de energia por mês.
Beneficiários:
- Famílias do CadÚnico com renda per capita até R$ 759
- Pessoas com deficiência ou idosos no BPC
- Famílias indígenas e quilombolas
- Sistemas isolados da região Norte
Essa ação prevê uma redução estimada de cerca de 12% nas contas de energia para cerca de 55 milhões de pessoas.
2. Abertura Progressiva do Mercado
O modelo de abertura gradual permite:
- Preparação adequada das distribuidoras
- Adaptação dos sistemas de medição
- Capacitação dos consumidores
- Desenvolvimento de infraestrutura tecnológica
3. Redistribuição de Encargos Setoriais
A redistribuição de encargos vem com o intuito de equilibrar a cobrança de encargos e subsídios do setor, de forma mais justa entre os consumidores e os ambientes de contratação. Essa ação deve aliviar os custos para o mercado regulado.
Impactos Regulatórios e Técnicos
Criação do Supridor de Última Instância (SUI)
Um deles é a criação do Supridor de Última Instância (SUI). Esse novo agente será responsável por garantir o fornecimento temporário de energia nos casos em que o consumidor do mercado livre ficar sem contrato vigente. Situações como a falência de uma comercializadora ou a saída repentina de um fornecedor são exemplos em que o SUI deverá atuar.
O SUI funciona como uma rede de segurança:
- Evita interrupções no fornecimento
- Protege consumidores de situações emergenciais
- Mantém a continuidade do serviço
- Será regulamentado pela ANEEL
Redistribuição de Custos de Angra 1 e 2
Hoje, quem paga o custo da reserva de potência das termelétricas nucleares são os consumidores residenciais, os consumidores do mercado regulado, sendo que a MP está dizendo que esse custo vai ser pago por todos os consumidores, inclusive do Mercado Livre.
Esta mudança representa:
- Maior equidade na distribuição de custos
- Redução de subsídios cruzados
- Distribuição proporcional entre todos os consumidores
Fim Gradual dos Descontos TUSD/TUST
Os atuais descontos nas tarifas de transmissão e distribuição (Tust e Tusd) serão mantidos apenas para contratos firmados até 31 de dezembro de 2025. A partir dessa data, novos contratos e prorrogações não terão acesso aos descontos.
Implicações técnicas:
- Contratos vigentes mantêm descontos
- Novos contratos sem benefícios tarifários
- Necessidade de reavaliação de viabilidade econômica
- Impacto na precificação de energia incentivada
Benefícios Esperados da Abertura
Para Consumidores Residenciais
No mundo inteiro, onde o consumidor de baixa tensão já pode escolher de quem ele vai comprar, entre 30% e 40% desses consumidores fazem essa escolha. Esta estatística internacional sugere uma adesão significativa no Brasil.
Vantagens práticas:
- Economia potencial de 20% a 25% na conta de luz
- Escolha de fontes renováveis
- Contratos personalizados
- Maior previsibilidade de custos
Para Empresas e Indústrias
O mercado livre de energia elétrica brasileiro propiciou a seus consumidores R$ 55 bilhões de economia nos gastos com energia elétrica em 2024. Este número impressionante demonstra o potencial econômico do modelo.
Benefícios corporativos:
- Redução de custos operacionais
- Competitividade aumentada
- Acesso a energia limpa certificada
- Flexibilidade contratual
Para o Sistema Elétrico
A expectativa é que a portabilidade no ambiente de contratação livre de energia ganhe um impulso ainda maior nos próximos anos, a partir da aprovação das regras pela ANEEL para o compartilhamento de dados de consumidores, o chamado "open energy".
Avanços sistêmicos:
- Maior eficiência energética
- Incentivo à geração renovável
- Modernização da infraestrutura
- Digitalização do setor
Quando a Abertura Total NÃO É Vantajosa
É fundamental reconhecer que o mercado livre não será ideal para todos os perfis:
Consumidores de Baixo Volume
Para residências com consumo abaixo de 200 kWh/mês, os custos de gestão e representação podem superar os benefícios econômicos. A complexidade administrativa pode não justificar a economia potencial.
Falta de Infraestrutura de Medição
A migração exige medidores inteligentes e sistemas de telemetria. A Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) ainda definirá os critérios para habilitação e funcionamento do SUI. Até que essa infraestrutura esteja amplamente disponível, alguns consumidores enfrentarão barreiras técnicas.
Consumidores com Baixa Capacidade de Gestão
O mercado livre exige:
- Compreensão de contratos complexos
- Monitoramento ativo do consumo
- Gestão de múltiplos fornecedores
- Conhecimento técnico mínimo
Para consumidores sem recursos ou interesse em gerenciar ativamente sua energia, o mercado cativo pode ser mais conveniente.
Riscos de Volatilidade de Preços
Embora contratos fixos ofereçam previsibilidade, contratos indexados podem expor consumidores a volatilidade. Se ela for aprovada parcialmente, a MP vai aumentar muito a tarifa de energia elétrica, algo de dois dígitos. Antes de explicar como isso vai funcionar, é importante esclarecer que quem vai pagar os R$ 3,6 bilhões da tarifa social são os consumidores residenciais das classes mais altas.
Período de Transição e Incertezas Regulatórias
A MP 1.300/2025 ainda precisa ser aprovada pelo Congresso Nacional. Por se tratar de uma medida provisória, o texto entrou em vigor imediatamente após a sua publicação, mas precisa ser aprovado pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal em até 120 dias. Se não for votado, perde a validade.
Desafios Técnicos de Implementação
Modernização da Infraestrutura
A abertura total exige:
- Instalação de medidores inteligentes em 93 milhões de unidades
- Sistemas de telemetria em tempo real
- Plataformas digitais de gestão
- Infraestrutura de comunicação robusta
Capacitação e Educação
A abertura do mercado livre ficou para 2027, enquanto a nova tarifa social começa daqui a 45 dias, se o mercado não for aberto, os demais consumidores vão pagar a conta, mas não vão ter o benefício da redução da tarifa. Este descompasso temporal representa um desafio de comunicação e educação.
Regulamentação Complementar
Entre as principais mudanças apresentadas, destaca-se a proposta de criação de um "Portal de Migração", obrigatório para todas as distribuidoras com mais de 60.000 unidades consumidoras (UCs). Esse portal tem como objetivo padronizar e otimizar o processo de migração.
A ANEEL precisará regulamentar:
- Procedimentos de migração
- Critérios de habilitação de comercializadoras
- Regras de faturamento
- Mecanismos de proteção ao consumidor
Implicações Práticas para Diferentes Perfis
Grandes Indústrias (já no mercado livre)
Essa ação prevê uma redução estimada de cerca de 12% nas contas de energia para cerca de 55 milhões de pessoas, mas grandes consumidores industriais enfrentarão:
- Redistribuição de encargos de Angra
- Fim de descontos TUSD/TUST para novos contratos
- Necessidade de reavaliação de estratégias de contratação
Médias Empresas (migração em 2026)
Este segmento terá:
- Oportunidade de economia significativa
- Acesso a comercializadoras varejistas
- Necessidade de planejamento antecipado
- Tempo para desenvolver capacidade de gestão
Consumidores Residenciais (migração em 2027)
Em 1º de dezembro 2027, todos os consumidores de baixa tensão (Grupo B) – ou seja, qualquer consumidor conectado à rede comum, como residências – poderão migrar para o mercado livre.
Considerações:
- Modelos simplificados através de varejistas
- Possibilidade de agregação comunitária
- Escolha entre simplicidade (cativo) e economia (livre)
- Educação e capacitação necessárias
O Papel da Tecnologia: Open Energy
A Aneel também propõe avançar na regulamentação do Open Energy, iniciativa que permitirá aos consumidores acessarem e compartilharem seus dados com quem desejar, mediante prévio consentimento. A proposta visa a implementação em duas etapas: até dezembro de 2025, os usuários poderão baixar seus dados e compartilhar com quem desejar; e até dezembro de 2026, serão criadas APIs para compartilhamento automático dos dados.
O Open Energy representa:
- Transparência total de dados de consumo
- Facilitação da comparação entre ofertas
- Empoderamento do consumidor
- Estímulo à competição justa
Alternativas Atuais: Energia Limpa Sem Migração
Enquanto a abertura total não chega, consumidores podem acessar energia limpa através de plataformas especializadas. Soluções como energialex.app oferecem portabilidade de energia 100% renovável (solar e eólica) para consumidores do Grupo A, com economia de até 20% para residências e 40% para indústrias, sem custos de migração e totalmente online.
Conclusão: Uma Transformação em Andamento
A MP 1.300/2025 representa um marco histórico na modernização do setor elétrico brasileiro. A Medida Provisória 1300 representa um marco histórico na política energética brasileira. Principalmente, ela equilibra inclusão social, eficiência econômica e sustentabilidade ambiental através de um modelo estruturado e gradual.
Os próximos anos serão decisivos:
- 2025: Aprovação da MP no Congresso e regulamentação pela ANEEL
- 2026: Migração de indústrias e comércios de baixa tensão
- 2027: Universalização completa do mercado livre
Para consumidores e empresas, o momento é de preparação: compreender o modelo, avaliar o perfil de consumo e acompanhar as regulamentações. A nova fase de crescimento é amparada pela Portaria 50/2022, que autorizou todo o Grupo A a escolherem o fornecedor no mercado livre. A Abraceel defende que todos os consumidores de energia, inclusive residenciais, tenham o mesmo direito a partir de 2026.
A transformação está em curso, e o conhecimento técnico será fundamental para navegar essa nova era do setor elétrico brasileiro. Ferramentas como energialex.app já facilitam o acesso à energia limpa e econômica, antecipando os benefícios da abertura total do mercado.
Sobre a autora
Ava Mendes é especialista em energia renovável e economia doméstica. Ajuda consumidores residenciais e empresariais a reduzirem custos com eletricidade através de portabilidade de energia. Conheça soluções gratuitas em energialex.app
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