Em 48:00
Pergunta de Adolfo Neto: O que você acha do valor que se dá ao Qualis na ciência brasileira?
Resposta de Guilherme Travassos:
Se eu pudesse ser bastante explícito e curto, eu diria que o Qualis se transformou numa doença, numa catarse coletiva.
E qual é o motivo disso? Bom, quando a gente implantou o Qualis – e quando eu falo "a gente", é coletivo, obviamente eu participei das discussões iniciais – a intenção era poder ter um referencial coletivo. Vou repetir de novo, coletivo, de produção, que pudesse servir para realizar alguma comparação entre GRUPOS de pesquisa.
Então, o Qualis olha para trás, vê o que é que o pessoal fez, equaliza isso para trás e depois faz uma comparação. É como se fosse quase que uma tentativa de normalização. Perfeito. A ideia é boa enquanto vai até esse ponto.
O Bicho-Papão e a Camisa de Força
O que acontece é que transformaram o Qualis num grande bicho-papão e usam o Qualis como camisa de força para a evolução tecnológica. Esse é o perigo. Isso é um desastre. Isso é um desastre.
O Qualis não é feito para avaliar indivíduos. O Qualis olha o passado, ele não vê o futuro. Então, se você trabalha na fronteira do conhecimento, vai ser muito difícil você conseguir estar no Qualis, porque o futuro não está no Qualis, só está no Qualis o passado.
Infelizmente, a baixa maturidade científica de vários dos nossos pesquisadores, e talvez a maturidade de vários coordenadores de programas de pós-graduação em nível muito baixo, levem a eles a acreditar que ele é uma camisa de força.
Então, o Qualis virou elemento de qualificar indivíduo. O Qualis virou elemento de julgar se um artigo é importante ou não. O Qualis virou elemento para dizer se aluno pode ou não pode ter financiamento para participar de um evento. Isso é impossível, isso não dá.
Um Sistema Falho e a Necessidade de Maturidade
Então, assim, do jeito que está hoje, para mim, eu sou absolutamente contra esse quadro.
Tem várias outras coisas que precisam ser avaliadas, que precisam ser consideradas do ponto de vista de qualidade, de maturidade, de seriedade, de importância, de relevância do que um pesquisador faz. E a gente precisa... felizmente, a gente tem visto uma evolução muito boa na Capes, os grupos que estão lá têm muito bom sucesso, são pessoas que são pesquisadores muito sérios que já perceberam isso.
Porque o Qualis virou, inclusive, elemento de manipulação de produtividade. Isso é muito ruim. Isso é muito ruim. A gente não precisa disso. A gente já tem maturidade científica suficiente para poder realizar um processo de avaliação, um processo de comparação muito mais maduro do que simplesmente se apoiar em números que flutuam, são ambíguos, não dizem muita coisa.
Esse negócio de tudo isso já acabou há muito tempo. Acho que a gente tem que gerar coisas que prestam, que façam sentido, que ajudem a sociedade, que possam realmente alavancar e transformar o nosso país. O resto é besteira.
Sendo bem franco em relação a isso, eu acho que o valor que se dá ao Qualis é absolutamente exagerado, desproporcional e irreal. Só isso.
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